segunda-feira, maio 24, 2010

O Bigode Do Meu Pai


Quando nasci, meu pai já tinha 44 anos e vários filhos de outras mulheres. Não vi, portanto, aquela figura paterna jovial, atlética, e com a disposição dos jovens adultos empolgados com a formação da sua família. Eu não era novidade. Ao invés disso, sempre vi a figura séria, daquele homem que parecia ser uma montanha, policial civil, sempre de óculos, e principalmente, de bigode. Era praticamente uma marca registrada o bigode, que desempenhava um papel importante na formação da imagem que sempre tive de meu pai: um homem sério, com um bigode sério.


Certo dia, porém, algo aconteceu. Algo que marcaria minha vida. Um momento que jamais esqueci e do qual me lembro com tamanha riqueza de detalhes que até parece ter se passado hoje de manhã. Eis o que aconteceu, em uma pacata manhã de domingo, em nosso apartamento na capital: estava eu, com meus aproximadamente 10 anos de idade, procurando meu pai pelo apartamento. Não o encontrando nos cômodos comuns, e ao ver uma luz acesa do banheiro, resolvi entrar. E foi então que meus olhos, incrédulos, depararam-se com a imagem de meu pai, com espuma de barbear sob o nariz, empunhando uma lâmina de barbear, esticando a pele acima do lábio superior suprimindo o mesmo, eliminando de sua figura o símbolo máximo da seriedade e sisudez. Assustado com a cena, que nunca imaginei que veria na vida (mesmo após anos e anos de insistência de minha mãe para que ele se livrasse do bigode), dei um grito e saí correndo contar para minha progenitora, que não acreditou em minhas palavras, mas que acabou igualmente espantada ao ver, minutos depois, um homem sem bigode saindo do banheiro.


Foi muito estranho. De repente, meu velho parecia tão desprotegido, desfigurado, pelado, e na minha imaginação de criança, até mesmo com frio. Não sei o que realmente motivou um homem de 54 anos a raspar o bigode. Ele provavelmente nem lembrava da última vez que o tinha feito. Até a pele sob o nariz estava mais clara, ressurgindo após décadas de escuridão sob os fios negros. Fios esses, aliás, que já não andavam tão negros. Estavam grisalhos, dando trabalho para tingir. Coisa que ele levou muito tempo para fazer, após insistência de minha mãe, e um pouco de influência do comercial do Grecin 2000.


Vai ver foi por isso que ele desistiu de ostentar seu bigode. Dava muito trabalho competir com o Tom Selleck.


segunda-feira, maio 17, 2010

A Pessoa Certa

Fiquei indeciso sobre o que escrever. Não sabia se seria melhor abordar um tema de forma humorística, de forma sarcástica (minha preferida), séria (raro acontecer) ou nonsense. Aí percebi que, além de não saber como escrever o que eu queria, eu não sabia o que eu queria como tema. E quando essas coisas acontecem, é melhor falar de algo comum pra todo mundo: o amor, da maneira mais sentimentalóide possível.

Acho fascinante observar aquelas mensagens pessoais que as pessoas deixam na internet. Pode ser no MSN, no Twitter ou Orkut, aquelas poucas palavras revelam bastante, e geralmente, são motivadas por outra pessoa, ou a busca pela outra pessoa. Juras de amor eterno, declarações públicas de afetividade, trocas de carinho virtuais. Tudo isso, todos os dias na tela do seu computador pessoal, só leva à conclusão que não é novidade pra ninguém, e que está sempre nas canções: “everybody is after Love”. Todo mundo busca ela: a pessoa certa.

Muitos e-mails já deram o ar da graça na minha caixa de entrada, com pequenos textos de autoria duvidosa, que exprimem as mais variadas formas de se lidar com as questões do coração. Mas, e aí, afinal de contas, o que é a pessoa certa?

Seria muita pretensão do degas que vos escreve pensar possuir a resposta dessa pergunta. Mas isso não me impede de dizer algo do tipo:

“Existe a pessoa certa? Ora, digo-vos que sim. Aliás, digo que existe mais do que apenas uma pessoa certa. Podem existir várias pessoas certas ao longo de sua vida. O que pode não ser certo, às vezes, é o momento que contextualiza a relação. Aí se busca outra pessoa certa. Para você e para o seu momento. Se é possível saber quando encontramos a tal pessoa certa? Creio que não. Ninguém nunca sabe quando a encontra. Você pode, sim, sentir. Sutilmente. Como um amanhecer suave. Quando a conversa flui tão fácil e divertidamente que se gasta uma madrugada nela sem a esgotar. Quando a vontade constante de se encontrar impera. Quando fazer algo por essa pessoa lhe dá uma sensação diferente, de mais que satisfação. Quando se compartilham gostos, dividem-se experiências e aprendem-se coisas novas, ou aprende-se a gostar de coisas antigas. Quando não é possível imaginar tudo de outro jeito, e enquanto houver esperança. Mas se essa última esmaecer, então a certeza vira incerteza, e uma vida com incertezas, essa, não vale a pena.”