segunda-feira, junho 06, 2011

A primeira vez que usei um cheat

Pra quem não está familiarizado com a palavra, cheat (do inglês, to cheat, trapacear) é o termo que se utiliza entre os gamers (aficionados por jogos eletrônicos) para se referir aos códigos que podem ser inseridos em alguns jogos para obter vantagens como vida infinita, munição infinita, invisibilidade, entre outras formas de trapaça que façam o jogador levar vantagem contra seus competidores ou contra a máquina.

Lembro-me com perfeição: o ano era 1996, e fazia pouco tempo que tínhamos em casa algo novo naquela época, que era um PC. Mas não era qualquer PC. Era um IBM Aptiva, do qual lembro com saudosismo e respeito. Era um Aptiva K25, com processador de 100 Mhz, 8 MB de ram, 850 MB de disco rígido, fax modem 28.8k (muito rápido) e um kit multimídia com direito a placa de som Soundblaster e CD-ROM de 4X. Uma máquina possante, linda, igual à da foto abaixo:

Eu era um guri de 11 anos muito feliz com esse brinquedo em casa. E como todo guri de 11 anos que possui um PC, eu gostava de instalar jogos nele e dedicar horas estragando meus olhos em um monitor CRT que devia consumir mais energia que um chuveiro. Um dos meus jogos preferidos era o Doom, um dos pioneiros do gênero First Person Shooter (jogos de tiro em primeira pessoa) e que era muito difícil. Foi aí que um certo dia meus colegas da quinta série me falaram dos tais códigos, que facilitariam o jogo. Era só digitar IDKFA para ter munição infinita e IDDQD para se tornar imortal. Não havia o acesso generalizado a Internet, portanto, ter acesso a tais artimanhas era algo difícil de se conseguir, geralmente através de folhas datilografadas, copiadas para propagar os cheats entre os amigos.

Cheguei em casa afoito para testá-los. Tenho gravado na mente os detalhes do momento: o divertimento inicial, a euforia de ter a sensação da imortalidade virtual. Logo em seguida, porém, comecei a não ver mais graça em utilizar cheats. Tirava todo o desafio do jogo, e eu gostava de desafios. Deixei de me interessar por eles, e até hoje não tenho a menor vontade de utilizá-los nas raras ocasiões em que jogo alguma coisa.

Mas não ficou só por aí. Tenho uma certa propensão a não me interessar por "atalhos". Gosto da sensação do dever cumprido contra todas as adversidades, a falta de tempo, de condições, de ferramentas, vencendo o cansaço e a dúvida. É recompensante olhar pra trás e ver o que conseguimos fazer em certas situações que acabam impressionando a nós mesmos. E mais ainda, saber que continuamos os mesmos, porém melhores, sem deixar de ser quem somos na essência.

Observo muitas situações diariamente que me fazem pensar. Como meus aluninhos de inglês tentando se esconder para achar uma resposta no livro durante algum jogo em sala de aula, ou copiando as respostas do colega durante um exercício com música, sem ao menos tentar completar os espaços vazios com seu próprio esforço. Não é apenas um espaço vazio em uma folha que ele deixa de completar. É um espaço vazio no seu caráter. E, acreditem, isso reflete na vida adulta.

Apenas mais uma das várias lições que aprendi com meu Aptiva.