quarta-feira, março 09, 2011

Lilian, e a verdade perturbadora sobre o caráter humano

Essa na foto é a minha melhor amiga Lilian, mais conhecida como Liu. Ela nasceu em 26 de Dezembro de 1996, e foi adotada por mim no início de 1997, como presente de aniversário. Obviamente, por estar há tanto tempo comigo, e por ter uma pelagem exuberantemente linda, tenho muito carinho por ela e a trato como sendo da família, mesmo.

O que aconteceu nos últimos dias foi uma experiência diferente para mim. Na segunda-feira de alegrias de carnaval fui acometido por um choque: as 10h da manhã, Lilian miava desesperada na garagem de casa. Desci até lá para ver o que estava se passando, imaginando alguma briga com um gato intruso, que ela sempre expulsava da vizinhança, e que a tivesse deixado muito estressada. Mas ao chegar, encontrei minha valente felina paralisada, com dificuldade ao tentar mover as patas traseiras, e com expressão abatida.

Nunca havia visto ela assim. Ela que sempre foi ágil, elegante, que subia em árvores e pulava muros com maestria, que colocava cachorros pra correr da frente de casa, ela, a dona do bairro, estava ali, paradinha, frágil, vulnerável. Foi difícil de entender, assim de cara.

Levei ela para meu quarto e a coloquei deitadinha no meu carpete, que ela tem como um de seus locais de cochilo, e onde me faz companhia silenciosa durante as horas que passo online. Nesse ínterim, minha mãe chamava um veterinário, e Lilian ainda fez um esforço para escalar minha cama com suas unhas, para ficar ali deitada, depois de quase cair de volta ao carpete. Justo ela, que em uma fração de segundo podia dar um pulo e se materializar entre minhas pernas enquanto eu lia algum livro antes de dormir (como na foto), justo ela, ter tanta dificuldade para subir na cama, que dureza.

O veterinário foi muito atencioso, e a medicou. Ao longo do dia, ela apresentou uma melhora que deixou todo mundo animado. Mas quando era por volta das 22h, repentinamente, ela teve um ataque de convulsões e se debateu forte contra o piso do meu quarto. Fiquei apavorado. Ligamos na hora para a veterinária em Santo Ângelo (a 60 km de casa), e ela disse que a levássemos para lá no mesmo instante. Corri para o carro, e levamos Lilian para lá. Nesta altura, eu já pensava em qualquer coisa, desde hipótese de envenenamento, até algum possível trauma causado por mim ao chegar no quarto escuro e pisar nela sem querer na sexta-feira de manhã (ainda morro de remorso ao pensar nisso).

Quando chegamos para a consulta de plantão, minha Liu estava aparentemente mais calma. A veterinária trata os bichos como se fossem seus filhos, e aplicou uma injeção nela, que protestou para que isso fosse feito.

Medicada, o susto passou, e a trouxemos de volta pra casa. Hoje, cumprimos a difícil missão de coletar sua urina para exames, que vão explicar melhor o porque das convulsões. Essa história toda parece ser muito estranha de ser contada em um blog, mas esse episódio me marcou pelo seguinte:

Muita gente me perguntou o que fiz no carnaval, ou como eu estava, e eu não consegui deixar de contar sobre a Liu, porque eu estava muito abalado com o que aconteceu. Mas algo me incomoda ao contar isso para algumas pessoas. Me incomoda, e me deixa ao mesmo tempo curioso. Algumas pessoas ao ouvirem (ou ao lerem) esta história, não conseguem disfarçar sua expressão como que dizendo "que babaca, tudo isso só por causa de uma gata", ou então a total indiferença sobre o que eu acabei de contar. Inclusive eu OUVI um comentário assim: "mas que bobagem, só por causa de uma gata, mas deixa morrer". Tá certo que eu ouvi isso de um bocaberta de 14 anos, que além de ser mais novo que a Liu, não tem nada na cabeça, mas é esse o futuro do Brasil, fazer o que.

Enfim, até acho interessante contar sobre essa segunda-feira de carnaval para ver a reação das pessoas. Me dói saber que algumas pessoas não consigam entender a dimensão do sentimento que pode existir entre um ser humano e um bichinho de estimação companheiro. Me dói acreditar que exista alguém que pense que uma vida de 14 anos não seja motivo suficiente para se largar de carro para uma consulta veterinária a 60 km de distância. É insuportável ver o olhar dessas pessoas. Mas na verdade eu sinto uma profunda pena. Pena de quem não consegue respeitar esse sentimento, de quem não tem a CAPACIDADE de entender ou sentir isso. Acho que isso revela muito do caráter das pessoas, e certamente eu não vou esquecer disso nunca mais.

Termino este post com uma citação apropriada de um cara que eu nem gosto muito, mas que falou por mim e por muita gente ao afirmar o que segue:

"O grau de civilização de uma sociedade pode ser medido pela forma como trata seus animais" (Mahatma Gandhi)